<p><img width="406" height="228" src="https://rollingstone.com.br/wp-content/uploads/2025/12/anne-lee-foto-tmdb-406x228.jpg" class="attachment-medium size-medium wp-post-image" alt="Amanda Seyfried protagoniza 'O Testamento de Ann Lee'" style="margin-bottom:1rem;" decoding="async" loading="lazy" srcset="https://rollingstone.com.br/wp-content/uploads/2025/12/anne-lee-foto-tmdb-406x228.jpg 406w, https://rollingstone.com.br/wp-content/uploads/2025/12/anne-lee-foto-tmdb-800x450.jpg 800w, https://rollingstone.com.br/wp-content/uploads/2025/12/anne-lee-foto-tmdb-768x432.jpg 768w, https://rollingstone.com.br/wp-content/uploads/2025/12/anne-lee-foto-tmdb-1536x864.jpg 1536w, https://rollingstone.com.br/wp-content/uploads/2025/12/anne-lee-foto-tmdb.jpg 1920w" sizes="auto, (max-width: 406px) 100vw, 406px" /></p><p>Os filmes tendem a retratar melhor a agonia do que o êxtase, mas<em><strong> O Testamento de Ann Lee</strong></em> apresenta uma representação impactante deste último logo no início. Estamos em Manchester, no início da década de 1760. A jovem<strong> Ann Lee</strong> (<a href="https://rollingstone.com.br/tags/Amanda-Seyfried/" target="_blank" rel="noopener"><strong>Amanda Seyfried</strong></a>) trabalha como faxineira em um hospital e mora com seu irmão <strong>William</strong> (<a href="https://rollingstone.com.br/tags/Lewis-Pullman/" target="_blank" rel="noopener"><strong>Lewis Pullman</strong></a>) e a filha de sua falecida irmã. Ela é uma mulher piedosa, que sente a presença de Deus em sua vida desde cedo. E, por ter sido forçada, devido à proximidade entre os cômodos, a presenciar seus pais copulando como animais no cio, ela também desenvolveu ideias conflitantes sobre os prazeres da carne. <strong>Ann</strong> e sua família são atraídos por uma comunidade religiosa que se separou tanto da Igreja da Inglaterra quanto do crescente movimento contrário conhecido como Metodismo. É uma seita à parte.</p>
<p>Eles se comunicam por meio da oração e se libertam confessando seus pecados. Mas sua adoração não para por aí. Os <strong>Shakers</strong>, como seriam chamados posteriormente, canalizam o Espírito Santo através do canto e da dança. <strong>Ann Lee</strong> abraça essa prática com o fervor de uma verdadeira crente. Assim, naturalmente, ao narrar a história dessa mulher — uma história em que acompanhamos <strong>Lee</strong> enquanto ela espalha a palavra de Deus, conquista convertidos e lidera seus seguidores para um lugar selvagem e muitas vezes hostil, que logo seria chamado de “América” — a cineasta <strong>Mona Fastvold</strong> nos coloca bem no meio do equivalente <strong>Shaker</strong> à missa. A congregação se contorce, às vezes em uníssono, gira e bate os pés; em um dado momento, uma fila de pessoas serpenteia por uma porta e entra em primeiro plano, enquanto a câmera gira na direção oposta. Eles batem as mãos contra o peito e levantam os braços para o céu, se movendo como marionetes. Seu hino marca o ritmo com uma cadência que envolve todo o corpo. Um close do rosto de <strong>Ann</strong>, enquanto sua cabeça se inclina para trás, testemunha a pura alegria que ela sente ao dar testemunho do Senhor. <strong>Fastvold</strong> está criando uma cinebiografia, mas está se apropriando dos elementos de um gênero muito mais adequado para retratar a transcendência espiritual: o musical cinematográfico.</p>
<p><iframe loading="lazy" title="THE TESTAMENT OF ANN LEE | Official Teaser | Searchlight Pictures" width="500" height="281" src="https://www.youtube.com/embed/-zK_nzG36mk?feature=oembed" frameborder="0" allow="accelerometer; autoplay; clipboard-write; encrypted-media; gyroscope; picture-in-picture; web-share" referrerpolicy="strict-origin-when-cross-origin" allowfullscreen></iframe></p>
<p>Para aqueles de nós que já tiveram algo próximo a uma experiência religiosa assistindo a filmes como <em><strong>Cantando na Chuva</strong> </em>(1952) ou <b><i>Caçadoras de Ouro de 1933 </i></b>(1933), a escolha de usar números musicais para retratar uma pessoa em completo êxtase é óbvia. E embora seja imprudente esperar que isso inspire um ressurgimento do interesse pelas canções e danças <strong>Shaker</strong>, à semelhança da revitalização do <em>bluegrass</em> promovida por<em><strong> E Aí, Meu Irmão, Cadê Você? </strong></em>(2000) há um quarto de século, tanto a coreógrafa <strong>Celia Rowlson-Hall</strong> quanto o compositor<strong> Daniel Blumberg</strong> certamente nos fazem perceber o poder transformador desses costumes ancestrais. Nem todos os números do filme transmitem a alegria primordial de corpos se movendo caoticamente pela tela, mas os poucos exemplos completos de pessoas comuns do século XVIII se entregando ao ritmo da música gospel sustentam o filme ainda mais do que as meticulosas recriações históricas. É um filme de época com pulso em compasso 6/8.</p>
<p>Após encontrar o que procura entre os <strong>Shakers</strong>, <strong>Ann</strong> começa a ter visões: anjos, serpentes, uma terra do outro lado do Atlântico que permitirá que sua causa se estabeleça. Ela também abandona a prática de sexo com seu marido ferreiro, <strong>Abraham</strong> (<a href="https://rollingstone.com.br/tags/Christopher-Abbott/" target="_blank" rel="noopener"><strong>Christopher Abbott</strong></a>), para grande desgosto dele. A união resultou na concepção de quatro filhos, todos os quais morreram logo após o nascimento. <strong>Ann</strong> acredita que seus pecados levaram à morte prematura deles. Ela quer honrar seus deveres conjugais, mas há um chamado maior a cumprir. Os <strong>Shakers</strong> devem guardar todo o seu amor para Deus. Nem mesmo prisões, violência ou a sensação incômoda conhecida como luxúria conseguem desviá-los.</p>
<p>Assim que <strong>Ann</strong>, seu irmão e sobrinha, e uma pequena congregação que inclui nossa humilde narradora, <strong>Irmã Mary Partington</strong> (<strong>Thomasin Mackenzie</strong>, de <em><strong>Noite Passada em Soho</strong></em>), chegam ao Novo Mundo pouco antes de ele se tornar uma nação soberana, <em><strong>O Testamento de Ann Lee</strong></em> se transforma em uma verdadeira história americana. Isso significa, entre outras coisas, uma parábola da perseguição, à medida que as liberdades prometidas por essas antigas colônias se chocam com os preconceitos e as noções populistas de que a força prevalece sobre o direito. O trabalho missionário de <strong>Will</strong> transforma os <strong>Shakers</strong> em um movimento e na fonte de alguns móveis excelentes. A declaração de <strong>Ann</strong> de que nenhum <strong>Shaker</strong> deve “pegar uma espada contra o Diabo”, referindo-se às tropas britânicas que tentam esmagar uma revolução, faz com que sejam tachados de traidores. Preparem-se para a agonia. O fim será trágico para o grupo, mesmo que o filme termine com uma tomada aérea à la Busby Berkeley que transmite uma sensação quase beatífica.</p>
<p><strong>Fastvold</strong> já havia coescrito <em><strong>O Brutalista</strong> </em>(2024) com seu parceiro profissional e pessoal, o diretor <strong>Brady Corbet</strong> (ele ajudou a escrever este roteiro, enquanto ela assumiu a direção), e, assim como aquela epopeia que evoca o espírito dos santos da Nova Hollywood, a atenção aos detalhes aqui — combinada com a grande dificuldade em mesclar o biográfico e o divinamente melodioso — é uma homenagem aos seus criadores.</p>
<p>As semelhanças com a crônica vencedora do <strong>Oscar</strong> de <strong>Fastvold </strong>e<strong> Corbet</strong> sobre a ascensão e queda de uma imigrante, no entanto, não param por aí. <em><strong>O Testamento de Ann Lee </strong></em>trata, na verdade, de um extraordinário senso de comprometimento em perseguir sua visão, seja para um despertar espiritual ou para empreendimentos artísticos que desafiam o mercado da indústria do entretenimento, até fins ilógicos e extremos. Isso vale em dobro para sua estrela, que se entrega ao papel com uma desinibição e uma dedicação que <strong>Lee</strong> consideraria admiráveis.</p>
<p>Ver <strong>Amanda Seyfried</strong> cantar com tanta devoção por um mundo além deste é ver o retrato de alguém que busca desesperadamente um vislumbre do paraíso na Terra. (Isso não deve ser confundido com o que ela está fazendo em seu outro filme em cartaz, <em><strong>A Empregada</strong></em>, que se concentra em mulheres presas em uma vida infernal perpétua. É a temporada de <strong>Seyfried</strong>!) É fácil se deleitar com as imagens da hora mágica, o espetáculo artesanal dos dançarinos se entregando à dança e o esforço geral necessário para recriar uma América do século XVIII vivenciando as primeiras dificuldades de crescimento. Tudo isso por si só já é uma conquista. <strong>Seyfried</strong> nos lembra que esta é uma história humana de fome e sede — literalmente, no caso da canção de Blumberg, “<strong>Hunger and Thirst</strong>“. O filme não é apenas um hino ao espírito pioneiro. É também um testemunho da atriz que a interpreta.</p>
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